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Desburocratização para Micro e Pequena Empresa

PROGRAMA NACIONAL DE DESBUROCRATIZAÇÃO

EM DEFESA DO CIDADÃO

8ª REUNIÃO DO COMITÊ INTERMINISTERIAL

5ª Reunião Itinerante

JOSÉ MARIA ROCHA FILHO

CONSULTOR DA MC CONSULTORIA E ASSESSORIA EMPRESARIAL LTDA., DE BRASÍLIA – DISTRITO FEDERAL


Chamou particularmente minha atenção, no “Correio Braziliense” de ontem, 26 de setembro, a reportagem intitulada “Quero Ser Meu Patrão”. E no final, há um quadro, evidenciando o que deve fazer o cidadão, “para montar uma empresa”. Eis a sua reprodução:


1. Levar à Junta Comercial do Distrito Federal (JCDF):

· Formulário de processo/requerimento

· Declaração de firma mercantil individual, em 4 vias

· Pesquisa de nome empresarial, feita gratuitamente pelo Sebrae/DF

· Documento de arrecadação fiscal (darf), com recolhimento de taxa no valor de R$ 7,59, em qualquer agência do Banco do Brasil.

2. Secretaria da Receita Federal (SRF):

· Ficha cadastral da pessoa jurídica (somente em disquete)

· Documento básico de entrada no cadastro nacional de pessoa jurídica (CNPJ).

3 . Secretaria de Fazenda do DF (SEF/DF):

· Ficha cadastral com dados pessoais e da empresa

· Consulta prévia para obtenção do alvará de funcionamento, formalizado à Administração Regional da cidade

· Cópia autenticada do cartão do Cadastro de Pessoa Física (CPF)

· Cópia autenticada de comprovante de localização de empresa.

Isso, registre-se desde logo, para uma “firma individual”. Para uma sociedade mercantil, há algumas exigências mais. E a coisa se complica mais ainda se o objetivo for extinguir uma empresa.

Analisando esse quadro, parece, à primeira vista, que é tudo muito simples, muito fácil de ser feito. Pergunto-lhes, porém: os Senhores já tentaram percorrer esse caminho? Já tentaram montar uma empresa? Se já percorreram esse caminho, sabem, muito bem, que a coisa não é tão simples como parece. Tanto não o é que estamos reunidos aqui, hoje, para tratarmos, exatamente da “desburocratização e desregulamentação dos processos de registro mpresarial”. Há vinte anos, não se pode esquecer, o saudoso Ministro Hélio Beltrão e sua equipe, fizeram exatamente o que estamos fazendo hoje.

Diante disso, quero convidá-los às seguintes reflexões:

· Qual é a causa da burocratização e do excesso de regulamentação de tais processos?

· Por quê estamos aqui, mais uma vez, tratando desse tema?

· Por quê estamos sempre repetindo experiências?

· Não será, talvez, porque a causa do problema nunca foi realmente atacada?

· Não será porque os órgãos incumbidos de fazer esses registros nunca pensaram, efetivamente, em quem é a razão de sua existência: o empresário, a empresa?

· Por quê há tantas empresas na informalidade, ou seja, sem registro nos órgãos competentes?

Estas, Senhores, as primeiras perguntas que me vieram à mente, quando comecei a me preparar para esta palestra. Os Senhores já pensaram nisso?

O certo é que o empresário – e muito especial e particularmente o microempresário – não recebe, não tem recebido estímulo algum para se registrar e, por isso, penso, se mantém na informalidade, na clandestinidade, se cabe a expressão.

Há nisso, parece-me, entre outros, um problema cultural:

1º) não se evidencia ao empresário – micro, pequeno ou grande – a importância do registro, para ele e para o País;

2º) os órgãos incumbidos desses registros parecem estar mais interessados em arrecadar do que em educar, ensinar, entre outras coisas, os benefícios advindos do registro;

3º) a carga tributária é tão grande que todos querem, afinal, se verem livres dela, para que possam sobreviver;

4º) visando mais aos seus próprios e específicos interesses e, talvez, até para justificar alguns elevados preços públicos, cria-se dificuldade para vender facilidade;

5º) não se pensa, nunca, que toda grande empresa foi, um dia, uma micro, uma pequena empresa.

E como nada nasce grande, perfeito, acabado, o micro, o pequeno empresário, mesmo tendo a pretensão de, um dia, vir a ser um grande empresário, ante esse quadro, busca, inconscientemente talvez, manter-se pequeno ou fingindo-se de morto, para não ser molestado pela Administração, para poder, enfim, tocar sua vida, sobreviver.

Tudo o contrário, penso, se, nessa fase – de concepção, nascimento e afirmação – recebesse esse pequeno empresário os estímulos necessários a que pudesse alcançar seu objetivo: firmar-se no mercado e crescer, cada vez mais forte e vigoroso; se o ambiente lhe fosse propício a que, um dia, se torne um grande empresário, agente gerador de centenas, milhares talvez, de empregos.

Em minha opinião, falta refletir, pensar sobre isso e, ao mesmo tempo, falta vontade – política e administrativa – para querer realmente que o microempresário se torne, um dia, não muito distante, um grande empresário.

Feitas estas reflexões, vejamos, em rápidas pinceladas e em síntese, quais são os problemas, afora os já mencionados, que enfrenta a pessoa que se quer tornar empresária, de forma legal:

a) no âmbito do Registro Público de Empresas Mercantis, em que pese ter a Medida Provisória n. 1.958-25/99 ter alterado a redação do art. 37, inciso II, da Lei n. 8.934/94, o art. 34, inciso II, do Decreto n. 1.800/96, que a regulamenta, continua exigindo a “certidão negativa de condenação por crime cuja pena vede o acesso à atividade mercantil, expedida pelo Distribuidor Judiciário da Comarca de residência” do titular da firma ou dos administradores da sociedade mercantil. Por outras palavras, ao contrário do que se pensava ao tempo da Lei n. 4.726/65, até prova em contrário, a pessoa é considerada culpada. Isso é um tremendo retrocesso!;

b) exigem as Juntas Comerciais, ainda, com o respaldo da lei, a apresentação da ficha de cadastro nacional de empresas mercantis (CNE), segundo modelo aprovado pelo Departamento Nacional de Registro do Comércio (DNRC). Essa ficha, registre-se, é uma síntese do ato constitutivo da empresa, que, necessariamente, deve ser apresentado. Logo, não há razão alguma para sua exigência. Deveria caber à Junta Comercial, então, se fosse o caso, providenciá-la. E se o objetivo é formar o cadastro nacional de empresas, que o ato constitutivo da empresa – e não a CNE – seja a sua base;

c) exigências não raras vezes descabidas e, pior ainda, não formuladas de uma só vez.

d) obtido o registro na Junta Comercial, parte-se para a obtenção do CNPJ e da Inscrição Estadual. Para que tanto número para identificação de uma só empresa? Um só não bastaria? E, aqui, volta-se a prestar, novamente, as mesmas informações que foram prestadas à Junta Comercial. Mais formulários têm que ser adquiridos e preenchidos. Se todos esses órgãos integram a Administração, não seria suficiente um só banco de dados, que seria utilizado por todos eles, no exercício de suas funções específicas?;

e) vencida essa fase, vem a de obtenção do “alvará de localização”, na Prefeitura Municipal. Nesta altura dos acontecimentos, o empresário já alugou um imóvel para nele exercer sua atividade e descobre agora, com tristeza, que a Lei de Posturas Municipais ou de Uso do Solo não permite o exercício daquela atividade naquele local. Que desilusão! Terá que começar tudo de novo. Deverá, primeiro, alugar outro imóvel, em local permitido pela Prefeitura e, depois, promover uma alteração contratual na Junta Comercial, para mudança de endereço, e, por conseguinte, nos demais órgãos, já mencionados. E o que fazer com o primitivo contrato de locação? Quem ressarcirá seu prejuízo? Por quê tudo isso? Porque não lhe foi ensinado que, antes de mais nada, já que assim o exige a lei, deveria ele certificar-se, perante a Prefeitura Municipal, de que a atividade poderia ser exercida naquele local. Nenhum desses órgãos, porém, o alertou disso.;

f) em algumas localidades, há, ainda, a necessidade de se obter uma autorização do Corpo de Bombeiros. Como? A fiscalização do Corpo de Bombeiros, penso, já deve ter ocorrido, antes de se conceder o “habite-se” ao imóvel. Para que essa autorização, para uma simples abertura de empresa?

E vai por aí afora.

Pergunto-lhes: será que não é possível evitar essa repetição de informações, esse mundo de formulários? Será que não é possível um banco de dados único? Penso que sim. E se verificarmos bem, encontraremos nas leis em vigor dispositivos nesse sentido. Por quê não são aplicados?

Recordo-lhes, aqui, minhas reflexões iniciais. E acrescento:

· Será que temos deixado de aplicar o método científico?

· Temos analisado e incorporado o valor das experiências?

· Sabemos o porquê de suas ocorrências?

· Se sabemos, por quê estamos sempre voltando ao mesmo tema?

· Se não sabemos, por quê não sabemos, se estamos sempre vivendo os mesmos fatos, os mesmos problemas?

Conquistas de outrora se têm transformado, pouco tempo depois, em coisas do passado, em coisa nenhuma, já que são facilmente esquecidas. E volta-se a fazer a mesma coisa, às vezes piorada, que se fazia antes. Não há memória; não há registro dos processos de mudanças, transformações. É preciso mudar esse estado de coisas.

Na atualidade, a MC Consultoria, para quem tenho a honra de trabalhar, está executando um projeto, desenvolvido pelo Sebrae, em conjunto com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, objeto da Concorrência n. 01/2000, que tem como escopo o desenvolvimento de pesquisa, diagnóstico, estudo técnico, análise e formulação de propostas visando a simplificar, desburocratizar e desregulamentar os processos de registro e legalização de empresas no País, notadamente para as micro e pequenas empresas.

Esse projeto vem ao encontro da estratégia institucional de contribuir, efetivamente, para a geração de novos e pequenos negócios, bem como para a sustentação dos existentes. Mas, se não estivermos atentos, daqui a pouco tempo, um novo grupo de trabalho estará fazendo a mesma coisa, estará repetindo a mesma experiência, como estamos, hoje, repetindo a experiência do Ministro Hélio Beltrão.

O trabalho tem demonstrado que os serviços de registro de empresas, de um modo geral, ainda se fazem de maneira pouco uniforme e harmônica. Por outras palavras, as formalidades e procedimentos variam de Estado para Estado, dificultando e onerando sua utilização.

O Sistema Nacional de Registro de Empresas Mercantis, integrado pelo Departamento Nacional de Registro do Comércio, como órgão central, normativo, e pelas Juntas Comerciais, como órgãos executores, não está, ainda, adequadamente estruturado e aparelhado e não atua com os níveis de eficiência e produtividade desejáveis, para que possa prestar serviços ágeis e seguros.

Daí, a necessidade de implantação de um programa de modernização que adote técnicas e métodos atualizados e possibilite o reaparelhamento do Sistema e, não só isso, a incorporação dos novos recursos tecnológicos.

Um ponto que se tem evidenciado como positivo, nesse Sistema, é a Central de Atendimento Empresarial – Fácil, que consiste em reunir em um só local os órgãos responsáveis pela legalização das empresas. Essa Central, diga-se logo, só foi implantada em poucos Estados. À primeira vista, isso parece um grande avanço e, efetivamente, pode e deve estar trazendo algum benefício. Como disse o Dr. Sérgio Moreira, Diretor Presidente do Sebrae, “domesticou-se, assim, a burocracia”. A fera, então, está domada. Mas não podemos nos esquecer de que ela continua fera, apesar de domesticada. Basta deixá-la um dia sem alimento que ela mostrará, novamente, quem realmente é. Com isso, quero dizer que não basta reunir em um só local os órgãos incumbidos desses registros, se as exigências, as dificuldades, continuam as mesmas. É preciso, isto sim, diminuir o número de exigências, de documentos, de formulários. É preciso maior e melhor integração e interação dos órgãos que participam do processo. É preciso maior agilidade nos serviços de registro. É preciso educar, ensinar, disseminar, enfim, por todos os meios possíveis, os conhecimentos a respeito.

E se houvesse entre esses órgãos uma colaboração efetiva, não haveria necessidade de “domesticar a burocracia”; não haveria a necessidade de reunir em um só local os órgãos envolvidos na questão. O registro seria feito em um órgão apenas – a Junta Comercial, por exemplo – que, logo em seguida, disponibilizaria suas informações, seu banco de dados, aos demais órgãos, dando-lhes melhores condições de – sem maiores atropelos, sem filas, com menor custo, sem tantos papéis – exercer suas específicas atribuições.

Este pensamento, entre outros aqui evidenciados, sou de opinião, não pode passar em branco neste Programa.

Meu tempo está esgotado e, por isso, agradecendo a atenção de todos, encerro minha participação, esperando, com estas palavras, ter contribuído, de algum modo, para o sucesso desse Programa Nacional de Desburocratização.

27/9/2000 – Auditório do Sebrae – Brasília – D.F.
Autor: José Maria Rocha Filho